DOM
CASMURRO
(MACHADO DE ASSIS)
Resumo:
Bentinho, apelidado de Dom Casmurro por um rapaz de seu
bairro, resolve escrever um livro por falta do que fazer. A partir daí, ele
mesmo conta sua história.
Bento Santiago (Bentinho) morava em Matacavalos com sua mãe,
Dona Glória (viúva), José Dias (o agregado), Tio Cosme (advogado e viúvo) e
prima Justina (viúva). Após a morte de seu primeiro filho, Dona Glória fez uma
promessa a Deus: se lhe abençoasse com outro filho, o mandaria para o seminário
para que se tornasse padre. Nasceu-lhe então Bentinho, que foi para o
seminário cumprir a promessa de sua mãe logo após completar 15 anos.
Ocorre que Bentinho já estava apaixonado por Capitolina, a
Capitu, sua amiga de infância, que lhe correspondia esse sentimento. Diante
dessa circunstância, com a ajuda de José Dias (o agregado), Bentinho obteve o
consentimento de sua mãe para sair do seminário e estudar Direito no exterior
(José Dias era fascinado por Direito e pelos estudos no exterior). Para cumprir
sua promessa, então, Dona Glória adotou um órfão e encaminhou-o ao
seminário. Após voltar ao Brasil formado em Direito, com a aprovação de sua
mãe, Bentinho se casou com Capitu.
Ainda no seminário, Bentinho fez um amigo, Escobar, que logo
passou a frequentar sua casa. Assim que Bentinho contou-lhe sobre seus planos
de se casar com Capitu, Escobar revelou que também não queria ser padre, e sim
comerciante.
Após sair do seminário, Escobar casou-se com Sancha, uma
amiga de Capitu, e teve com ela uma filha. Capitu, de início, não conseguia
engravidar, até que veio-lhe um filho, Ezequiel. O menino tinha mania de imitar
os outros, principalmente Escobar, mania esta que não conseguiram tirar.
Tudo ia bem até o falecimento de Escobar. Durante o enterro,
Bentinho percebeu que Capitu não chorava, mas expressava um sentimento muito
forte pelo amigo da família. Neste momento teve início o drama de Bentinho. Ele
logo notou que seu filho, Ezequiel, estava cada vez mais parecido com Escobar,
e se deu conta de que já havia ‘flagrado’ Capitu e Escobar sozinhos em casa
algumas vezes. Antes desse fato, Betinho nunca havia desconfiado de nada, mesmo
porque confiava muito em Escobar. Seu desespero daí em diante, porém, tornou-se
cada vez maior.
Como Bentinho via Escobar jovem em seu filho, começou a
evitá-lo, pois para ele o filho era a prova da traição que sofrera. Atordoado,
Bentinho pensou até mesmo em se suicidar, mas acabou desistindo do plano.
Capitu, Bentinho e Ezequiel foram então para a Europa, mas
Bentinho acabou retornando sozinho ao Brasil (nessa data, Dona Glória e José
Dias já haviam morrido). Ia de vez em quando para a Europa para disfarçar, já
que as pessoas perguntavam-lhe muito sobre sua esposa e seu filho, mas acabava
não procurando por eles em suas viagens.
Depois do retorno de Bentinho ao Brasil, Capitu
escreveu-lhes várias cartas, mas as respostas eram sempre breves e secas. Após
o falecimento de Capitu, que foi enterrada na Suíça, Ezequiel voltou ao Brasil
e deu a notícia ao pai. Embora ver o filho o deixasse cada vez mais certo da
traição, dada a semelhança entre Ezequiel e Escobar, Bentinho fez seu papel de
pai e financiou-lhe uma viagem a Grécia, Egito e Palestina, já que o menino
gostava muito de arqueologia. Durante a viagem, Ezequiel morreu de febre
tifóide e foi enterrado em Jerusalém, deixando Bentinho sozinho com sua dúvida.
Na realidade, embora o próprio narrador (Bentinho) afirme
ter sido traído, Machado de Assis consegue deixar o leitor em dúvida quanto à
suposta traição de Capitu, personagem forte e envolvente, consagrada na
literatura brasileira por seus olhos profundos e inexplicáveis, “olhos de
cigana oblíqua e dissimulada” ou “olhos de ressaca”, segundo a definição de seu
próprio marido, o ciumento Bento Santiago. até a velhice, Bento vive
em estado de relativa reclusão, o que faz surgir seu apelido: Dom Casmurro, que
quer dizer introspectivo.
Ocorre que a expressão tem outro significado, que o narrador
esconde do leitor desavisado: teimoso. E se a primeira definição mostra o
comportamento do narrador, esta última revela o traço mais forte de sua
personalidade: a insistência em defender o ponto de vista de acordo com o qual
foi traído, mesmo sem a apresentação de provas incontestáveis.
Personagens
Capitu: A
personagem nos é pintada leviana, fútil, a que desde pequena só pensa em
vestidos e penteados, a que tinha ambições de grandeza e luxo. Capitu
acaba se tomando a dona do romance: forma, inicialmente, com o narrador, um “duo
terníssimo” e, depois, possa a constituir o centro do drama do protagonista
masculino, com a entrada em cena de Escobar (“trio") e de Ezequiel (“quattuor”).
Bentinho: também protagonista, que ocupa uma postura
de anti-herói. Não pretendia ser padre como determinara sua mãe, mas tencionava
casar-se com Capitu, sua amiga de infância. Um fato interessante é que os
planos, para não entrar no seminário, eram sempre elaborados por Capitu. É o
narrador e pseudo-autor da obra. Na velhice, momento da narração, era um homem
fechado, solitário e triste. As lembranças de um passado triste e doloroso
tornaram-no um indivíduo de poucos amigos.
Dona Glória: mãe de Bentinho, que desejava fazer do
filho um padre, devido a uma antiga promessa, mas, ao mesmo tempo, desejava
tê-lo perto de si, retardando a sua decisão de mandá-lo para o Seminário.
Portanto, no início encontra-se como opositora, tornando-se depois, adjuvante.
Tio Cosme: irmão de Dona Glória, advogado, viúvo,
"tinha escritório na antiga Rua das Violas, perto do júri... trabalhava
no crime"; "Era gordo e pesado, tinha a respiração curta e os
olhos dorminhocos". Ocupa uma posição neutra: não se opunha ao plano
de Bentinho, mas também não intervinha como adjuvante.
José Dias: agregado, "amava os superlativos",
"ria largo, se era preciso, de um grande riso sem vontade, mas
comunicativo... nos lances graves, gravíssimo", "como o tempo
adquiriu curta autoridade na família, certa audiência, ao menos; não abusava, e
sabia opinar obedecendo", "as cortesias que fizesse vinham
antes do cálculo que da índole". Tenta, no início, persuadir Dona
Glória a mandar Bentinho para o Seminário, passando-se, depois, para adjuvante.
Vestia-se de maneira antiga, usando calças brancas engomadas com presilhas,
colete e gravata de mola. Teria cinqüenta e cinco anos. Depois de muitos anos
em casa de D. Glória, passou a fazer parte da família, sendo ouvido pela velha
senhora. Não apenas cuidava de Bentinho como o protegia de forma
paternal.
Prima Justina (prima de Dona Glória): Parece opor-se
por ser muito egoísta, ciumenta e intrigante. Viúva, e segundo as palavras do
narrador: "vivia conosco por favor de minha mãe, e também por interesse",
"dizia francamente a Pedro o mal que pensava de Paulo, e a Paulo o que
pensava de Pedro".
Pedro de Albuquerque Santiago: falecido, pai de
Bentinho. A respeito do pai o narrador coloca: "Não me lembro nada
dele, a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande; o retrato
mostra uns olhos redondos, que me acompanham para todos os lados..."
Sr. Pádua e Dona Fortunata: pais de Capitu. O
primeiro, "era empregado em repartição dependente do Ministério da
Guerra" e a mãe "alta, forte, cheia, como a filha, a mesma
cabeça, os mesmos olhos claros". Jamais se opuseram à amizade de
Capitu e Bentinho.
Padre Cabral: personagem que encontra a solução para
o caso de Bentinho; se a mãe do menino sustentasse um outro, que quisesse ser
padre, no Seminário, estaria cumprida a promessa.
Escobar: amigo de Bentinho, seminarista, "era
um rapaz esbelto, olhos claros, um pouco fugitivos, como as mãos,... como tudo".
Ezequiel Escobar foi colega de seminário de Bentinho e, como este, não tinha
vocação para o sacerdócio. Melhor amigo de Bentinho. Gostava de matemática e do
comércio. Quando saiu do seminário, conseguiu dinheiro emprestado de D. Glória
para começar seu próprio negócio. Casou com Sancha, melhor amiga de Capitu.
Morreu afogado depois de enfrentar a ressaca do mar.
Sancha: companheira de Colégio de Capitu, que mais
tarde casa-se com Escobar.
Ezequiel: filho de Capitu e Bentinho. Tem o primeiro
nome de Escobar. Quando pequeno, imitava as pessoas. Vai para a Europa com a
mãe, estudou antropologia e mais tarde volta ao Brasil para rever o pai. Morre
na Ásia de febre tifóide perto de Jerusalém.
Importância do livro
A temática da traição, presente em Dom Casmurro é instigante por
si só. A traição conduz o ser humano aos limites da racionalidade e à beira da
perda da razão. No entanto, o traço fundamental da obra é o questionamento da
verdade, entendida como um dos edifícios do realismo a que o próprio escritor
pertencia. A intensidade desse diálogo – com o tempo, com as emoções humanas e
com a arte – faz de Dom Casmurro um romance de releituras
sempre proveitosas.
As marcas mais evidentes do estilo machadiano estão
presentes no livro: a digressão (suspensão da narrativa para o desenvolvimento
de reflexões paralelas), a metalinguagem (discurso sobre a própria arte) e o
diálogo com o leitor, quase sempre conduzido com fina ironia.
Período histórico
O Brasil da segunda metade do século XIX era uma economia em formação e em
transformação. O estabelecimento de bases capitalistas relativamente modernas
convivia, e conviveria ainda por muito tempo, com a persistência de hábitos e
pensamentos conservadores.
ANÁLISE
Encerrado o relato de suas memórias, Bento Santiago pode até
se dar por satisfeito em ter sua tese comprovada. O leitor atento, porém, pode
se permitir duvidar dele. O comportamento de Capitu no velório de Escobar não é
prova suficiente de adultério. Tampouco a semelhança de Ezequiel, já que esta é
alegada pelo narrador, sem que nenhuma outra personagem se manifeste a
respeito.
Cada acusação que pesa sobre Capitu pode ser desmentida por
quem se preste ao papel de advogado de defesa da moça. Mas se alguém, de fato,
resolver cumprir a missão, é bom não esquecer que está duelando com um advogado
bem sucedido. Se o leitor pode duvidar da verdade que Bento lhe apresenta, não
tem muito o que fazer para contestá-la. Se os fatos alegados por ele podem ser
questionados, também podem ser usados para montar uma história convincente –
exatamente a que ele relata.
E enquanto os leitores se envolvem em incansáveis e
intermináveis disputas a respeito da atribuição ou não de culpa a Capitu, muito
provavelmente Machado de Assis se diverte, do espaço de onde poderia escrever,
se quisesse, as suas próprias memórias póstumas. O motivo de seu riso é a
própria discussão.
Na verdade, Dom Casmurro é um romance que
trata da traição, sem que ela seja seu tema fundamental. O que se discute é o
conceito de verdade, tema que transcende as traições, atingindo todos os níveis
do relacionamento humano e, mais ainda, a forma como a humanidade constrói seus
valores e sua moral.
Assim, Dom Casmurro toma a traição como
ponto de partida para discutir temas mais amplos e permanentes, o que lhe
confere a condição de obra atual. Ao mesmo tempo, parte dessa discussão ilumina
seu próprio tempo, o que lhe confere uma marca histórica.
Sobre o autor
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Machado de Assis
✩ 21 de Junho de 1839
✞ 29 de Setembro de 1908 (69 anos) |
Joaquim Maria Machado de Assis ,nasceu no dia 21 de Junho de 1839,na cidade Rio de
Janeiro (RJ).Foi um escritor brasileiro, considerado por muitos críticos,
estudiosos, escritores e leitores um dos maiores senão o maior nome da
literatura do Brasil. Machado de Assis conseguiu como poucos desentranhar
dos acontecimentos políticos de seu tempo o significado humano mais profundo.
Assim, o ambiente aparentemente pacífico da vida institucional brasileira da
segunda metade do século XIX escondia a violência da escravidão e do sistema de
troca de favores que norteava a relação entre ricos e pobres. Ao falar do
Brasil, Machado desnudava o ser humano em sua miséria moral. E construía a obra
mais genial de nossa literatura. Faleceu em 29 de Setembro de 1908.